26.2.10

Encontre as diferenças...

...nestas experiências. É certo que algo se passa com o clima, fora da tranquilidade estatística dentro da qual nós, os que hoje estamos vivos, temos existido ao longo da maior parte das nossas vidas. Mas daí à histeria colectiva e a certas eco-tretas, vão léguas abissais.


1.Mandam as boas práticas que separemos o lixo de acordo com as quatro cores.

Sucede que pelo menos uma vez nos últimos tempos já eu vi os senhores que esvaziam os ecopontos deitarem tudo para dentro do mesmo TIR. Deve ser para separar depois. Aqui a semelhança é com aqueles Governos que passam leis dignas de um séquito marciano, como a das permutas. Não tem nada a ver, pois não? A ideia é mesmo essa.

2.Se apagares os ledzinhos e prescindires de fazer a barba com água corrente, estás a ajudar a salvar o que é de todos.

Ai estou? A mim parece-me ser outro caso alegórico, como quando um Governo invoca a necessidade de apertar o cinto da população, e depois, só em almoços e carros, gasta mais do que o equivalente a 1% ou 2% de aumento para toda a gente, durante um ano inteiro.

E um gajo tem que levar com isto todos os dias, ad aeternum, sob pena de ser apodado de troglodita.

To be continued.


25.2.10

Fazer coisas, fazer coisas

Aos activos falta, habitualmente, a actividade superior: refiro-me à individual. Eles são activos enquanto funcionários, comerciantes, eruditos, isto é, como seres genéricos, mas não enquanto pessoas perfeitamente individualizadas e únicas; neste aspecto, são indolentes. A infelicidade das pessoas activas é a sua actividade ser quase sempre um tanto absurda. Não se pode, por exemplo, perguntar ao banqueiro, que junta dinheiro, qual o objectivo da sua incansável actividade: ela é irracional. Os homens activos rebolam como rebola a pedra, em conformidade com a estupidez da mecânica. Todos os homens se dividem, como em todos os tempos também ainda actualmente, em escravos e livres; pois quem não tiver para si dois terços do seu dia é um escravo, seja ele, de resto, o que quiser: político, comerciante, funcionário, erudito.

- Nietzsche

Left, Right (4)



Left, Right (3)

No matter how critical you are of a situation, the moment you say anything that could be interpreted by a leftist as the slightest defense of it, you have then achieved "unprecedented heights" of "narrow-mindedness and egoism".

Left, Right (2)

"The name-calling technique links a person, or idea, to a negative symbol. The propagandist who uses this technique hopes that the audience will reject the person or the idea on the basis of the negative symbol, instead of looking at the available evidence."


When there is no audience and yet someone keeps using these techniques on you, what's to be gleaned from that behavior?

Left, Right

"Who is really close minded: the person who raises a point or the person who responds with epithets?"


People on the receiving end of such desultory blasts may notice an increase in the assault's strength that is often directly proportional to their conciliating efforts.

18.2.10



Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? Quam diu etiam furor iste tuus nos eludet? quem ad finem sese effrenata iactabit audacia?

How long, O Catiline, will you abuse our patience? How long is that madness of yours still to mock us? When is there to be an end of that unbridled audacity of yours?


A crónica de Mário Crespo


Voltamos às fotocópias

'Não te posso publicar esta crónica'. 'Tu és Director, saberás o que fazer'. 'Eu sei que sou director. Não preciso que digas que sou Director. Eu sei que sou Director!'. 'Posso dizer-te que se fosse eu Director, publicava'. 'Eu tenho que confirmar isto e a esta hora não consigo ligar ao Primeiro-ministro'. 'Tu és Director saberás o que fazer, não publicas e eu nunca mais escrevo para ti'. 'Eu tenho que investigar isto'. 'Faz o que quiseres, investiga o que quiseres. Não publicas e eu nunca mais escrevo para ti'. 'Sobre isso falamos depois'. 'Não, Zé Leite Pereira, nós não falamos mais'.

Há qualquer coisa fisicamente dolorosa quando se recebe a notícia de que o nosso trabalho foi censurado. O estômago aperta-se. Sentimos que estamos com os olhos demasiado esbugalhados e não conseguimos fixar a vista em nada. Durante muito tempo. O olhar vagueia por tudo, evitando tudo. Tenta-se respirar fundo, mas a respiração sai curta e durante uns minutos é insuficiente. E ficamos ainda mais inquietos. Depois hiperventila-se e fica-se agitado. Um corpo estranho começa a apertar-nos uma zona indefinida do tórax logo abaixo do pescoço. E fica aí a lembrar-nos que há solidões novas que ainda não tínhamos experimentado. Depois cai uma imensa melancolia. Terá sido provavelmente isto que Luís de Sttau Monteiro sentiu em 1960 quando o SNI mandou a sua editora retirar 30 páginas do seu Um Homem Não Chora. As trinta páginas em que ele articula raivas surdas contra o sufoco do Estado Novo, enquanto a sua personagem desce a Avenida da Liberdade mastigando obsessivamente grãos de café.

Terá sido isso que, também, António de Almeida Santos sentiu a 30 de Maio de 1959 quando o Secretariado Nacional de Informação decretou que o seu livro de contos A Rã no Pântano era matéria proibida. Nos poucos dias que esteve nas livrarias o autor deu uma cópia ao meu pai, que é hoje parte do nosso património familiar, com a dedicatória onde se lê numa magnífica caligrafia inclinada de uma caneta de tinta permanente (as Futura de feltro ainda não tinham sido inventadas) 'Ao Eduardo Crespo, com as homenagens e a estima do Almeida Santos'. Mais de meio século depois A Rã no Pântano foi reeditada com um registo na capa onde se lê 'A primeira edição deste livro foi apreendida pela PIDE'. Lá dentro está uma dedicatória na mesma bela escrita inclinada (já com uma Futura de feltro preta) onde se lê: 'Ao Mário Crespo, com admiração e amizade, esta segunda edição de um livro que ofereci a seu pai antes da PIDE o ter apreendido. Almeida Santos'. Quando recebi a reedição da Rã no Pântano lembro-me de ter comentado com o Dr. Almeida Santos que hoje parece impossível o que aconteceu, e o imenso trabalho que tinha sido rectificar todo um sistema orientado para o controlo do pensamento, fosse através de um livro de contos, fosse espartilhando noticiário banal em modelos oficialmente tolerados.

Na parte de trás desta crónica, que vou distribuir de mão em mão em fotocópias, porque em Janeiro de 2010, por razões de conteúdo politicamente incorrecto, censuraram a minha coluna de opinião no Jornal de Notícias, está o que se chamava nas redacções um 'linguado' de prova. Era de A Capital, um diário de que fui o primeiro Director depois do 25 de Abril quando, com a privatização, A Capital se libertou de tutelas estatais e políticas. Trouxe de lá este texto dos anos 70 com o corte da censura. Fascina-me ver o género de notícias que a Censura não tolerava. Interpretações da realidade, perguntas e sobretudo factos insofismáveis. Havia só uma verdade consentida. A oficial. Tudo o mais era desviante, e o desvio tinha que ser rectificado.

Já depois da minha crónica O Fim da Linha ter sido censurada por José Leite Pereira, o sociólogo Paquete de Oliveira, provedor do telespectador na estação de televisão do Estado, sentiu-se no dever de escrever uma crónica no espaço de opinião que eu ocupei durante mais de dois anos, onde, para substanciar a imensa liberdade de expressão que ele diz sentir no Jornal de Notícias, afirma que: 'Nunca me mudaram uma vírgula que fosse sem me consultarem'. É essa a diferença entre mim e Paquete de Oliveira a quem, em consulta, podem mudar as vírgulas. Eu, quando escrevo opinião, faço-o de forma definitiva. Tenho imenso cuidado com as vírgulas. Se calhar a conversa com José Leite Pereira que reproduzi no início teria tido outro desfecho se eu, tal como Paquete de Oliveira faz, tivesse autorizado que me alterassem ocasionalmente umas vírgulas. Mas, por outro lado, isso nem sequer foi contemplado. À meia-noite, quando Leite Pereira me contactou, já o Jornal de Notícias estava a ser impresso. A minha crónica já tinha chegado ao fim.

Mário Crespo 17.02.10

14.2.10

Tudo o que é de ouro reluz

Por aversão à desventura vivida nas horas transactas, fez-se questão de averbar, desta vez, um ponto certo na coluna das vitórias.

Chegados ao Fundão ao virar da décima-terceira hora, demos com o restaurante O Alambique de Ouro, pertença do Hotel Alambique - cuja existência mereceu recente upgrade com a aposição de uma quarta estrela junto ao nome - repleto de convivas compondo a sala por forma a aguçar ainda mais os apetites que rememoravam as visitas anteriormente aqui feitas.

Nesta casa o standard de serviço é tal, e hoje não foi caso para manchar a estatística, que por maior afluência nunca um pedido é esquecido, adulterado, deixado ao correr do azar. Antes que um vampiro pudesse cheirar-nos o sangue quente a afluir ao palato, compareceram sobre a mesa: ovos verdes, três unidades isentas, sequinhas, bem fritas e passíveis de consumo sem peias colesterofóbicas; xerovia (cenoura branca) frita e salada de grão com bacalhau, com séquito de pão estaladiço e oloroso, degustados ao longo da primeira garrafa da tarde, um Esteva da mesma colheita requerida aquando da crónica anterior, mas de todo dali demarcada por ter sido, desta feita, servida à temperatura correcta e nem menos um grau. Marcharam ainda uma pasta de atum pouco oleosa portanto sápida ao milímetro, e pratinho de enchidos regionais de fazer inveja a um fauno dos mais inveterados.

Por provar mas ainda assim aprovados sob a vista e o olfacto ficaram os queijinhos frescos, bonitos e rígidos qb, que viveram para contar outro conto só e apenas por uma crise repentina de pudores dietéticos sobrevinda do nada.

Ao recair da Esteva comeram-se bochechas de porco macias, capazes de adular um faquir centenário, ladeadas por migas, batata frita em rodelas perfeitas, grelos, salada de tomate com orégãos (respire o leitor até sentir-se seguro) e feijão branco inchadinho de tão cuidadamente estufado. Apareceu, para quem estava sob restrições calóricas, o cabrito selvagem no churrasco (o chefe de sala, sempre alerta e vigilante, ainda havia sugerido mandar vir o chibo estufado para não desperdiçar os sucos) com arroz de feijão caldosíssimo.

Por esta altura nem sombra de memória já havia dos desaires da véspera. O staff deste Alambique, enquanto ciranda carreando para as mesas tanta arroba de satisfação, é um carrossel magnífico de vislumbrar, as faces repletas de competência e atenção.

A carta dos doces ainda veio mas faltou-nos a coragem para ir além do dito da casa. Sofre-se de alguma parcimónia, como de resto sucede em 98% da restauração em Portugal, é por não haver maltes condignos para o remate de tão avassaladora incursão pelo sonho de Epicuro. Ainda assim, o que havia bastou.

Relação qualidade/preço a tender para o infinito, sem vazios assimptóticos - quisera eu rapidamente obter o brevet de helicóptero para aqui poder pulular vezes sem conta.

13.2.10

Dêem-lhes formação...


Até 2007, ao chegarmos a Castelo Branco após travessia da A23 - que hoje pode ser feita, salvo aluimentos ou outro epifenómeno que mereça um alerta colorido por parte do SNPC - podia saborear-se uma bela refeição tradicional, a custo convivial, no restaurante Frei Papinhas. Podia, mas desde então que se deixou de poder. A aventura começa quando os nossos heróis acabam de sentar-se.

Ao início da tarde, a sala encontra-se vazia; apenas se apresentam o gerente e duas senhoras, uma bandeira do Brasil e outra de Portugal, além do mobiliário essencial.

A carta é sintética: picanha, bacalhau, e mais dois ou três pratos sem raridade nem interesse científico. Carta de vinhos exígua, composta por elementos, sem excepção, medianos.

Primeira pergunta: estes 7,50 escritos à mão junto à descrição do bacalhau são meia-dose? Resposta que devia ter logo feito acender todas as luzes de aviso: não não, só há doses completas.
Bom, então que sejam dois bacalhaus assados, uma costeleta de novilho, uma garrafa de Esteva tinto, e legumes cozidos...

Enquanto esperávamos pelo vinho, o gerente, um senhor brasileiro aparentando cerca de 50 anos, sugere que provemos a morcela. Mal anuímos, torna-se evidente que as oito rodelas do enchido vieram para a mesa geladas, num estado de entropia próprio do fim dos tempos.Mandamos para trás e eis que regressa aquecida a golpes de microondas.

Aterram ainda umas rodelas de salsicha brasileira com bacon frito, que hoje recordamos como o único ponto simpático em toda a nossa história.

Chega o Esteva, que é provado (na ausência do serviçal, que tinha ido tratar de outros assuntos) a cerca de 14º. Fazendo uso da palavra, informamos que o vinho está pouco cálido, demasiado frio. Retorque o nosso interlocutor, para grande assombro da mesa, que se o quisermos fresco, gelado, também se arranja. Dizemos que não, que o problema é exactamente o oposto. A perplexidade da pessoa é patente na forma como balbucia "mas ninguém nunca se queixou disso antes"...

Imaginamos logo de seguida que, sem dúvida, teremos vindo parar a um antro da mais vulgar mediocridade, já que, feitos os reparos ao bacalhau semi-esturricado e ao naco de gordura organizada na vertical e que nem no Uganda passaria por uma costeleta, a resposta foi a mesma: nunca ninguém se queixou antes, "os senhores não são de cá...?"

Next. As batatas fritas estão cruas por dentro. Informamos que aquele tipo de fritura deve ser feita sem que o óleo esteja demasiado quente nem as batatas semi-congeladas, por forma a evitar aquele efeito. É como informar um ónagro sobre as leis de Kepler. Idem para a quantidade das batatas a murro: quatro batatinhas do tamanho de um dedal, para duas doses de bacalhau. Mas isto enfim, poderia passar por maneirismo, nos dias em que há gente a comer uma lasca de pescada com meio bróculo, quiçá em espuma ou em suspensão coloidal, e a tornar ao seio de suas casas cheia de gáudio por lhes ter sido dada tão opípara chance.

Os cafés foram para trás duas vezes, por virem queimados. Explicámos os rudimentos que são do nosso conhecimento, sobre máquinas de café, moagem, pressão, e demais engenharia retro-balconiana. A senhora que tirava os cafés, que era oriunda de uma eslavónia qualquer, apressou-se logo a reportar que não era dali, só tinha ido fazer umas horas. Nós percebemos.

Da conversa final ficou-nos a dúvida entre o maior de dois medos: se ninguém se queixa, que espécie de povo é que anda, ciclicamente, a sufragar os destinos dos nossos filhos, elegendo os seus representantes com o mesmo apuro com que almoça farelo da pior espécie, a preço de vitela macia? Por outro lado, se havendo quem se queixe, estivermos ainda assim entregues, porque o mercado assim o dite ou por desistência dos melhores candidatos, a curandeiros que abrem um restaurante como quem compra um carro, o que dirá isso de "nós" enquanto merecedores de melhor sorte?

11.2.10

Espero que amanhã se faça História

Freedom, as every schoolboy knows,
Once shrieked as Kosciusko fell;
On every wind, indeed, that blows
I hear her yell.

She screams whenever monarchs meet,
And parliaments as well,
To bind the chains about her feet
And toll her knell.

And when the sovereign people cast
The votes they cannot spell,
Upon the pestilential blast
Her clamors swell.

For all to whom the power's given
To sway or to compel,
Among themselves apportion Heaven
And give her Hell.

- Ambrose Bierce

If ye love wealth better than liberty, the tranquility of servitude better than the animating contest of freedom – go home from us in peace. We ask not your counsels or your arms. Crouch down and lick the hands which feed you. May your chains set lightly upon you, and may posterity forget that you were our countrymen.

-Samuel Adams, 1 de Agosto de 1776, Philadelphia

E que, de caminho, caia igualmente a Câncio e o Pedro Lomba se fique a rir, com garbo e até lhe faltar o ar :)

"Por razões óbvias, nunca me fiz de herói do que quer que seja. Nunca me perseguiram e nunca me condicionaram. Só não gostaram de uma coisa que escrevi e atiraram-me para rua. Precisamente por isso, quem sabia muito pouco sobre as circunstâncias em que a minha saída do diário económico se processou, mas ainda assim comentou o assunto com ligeireza, alimentando o que ouviram ou que lhe contaram, andou a pregar uma filha-da-putice e a propagar uma mentira. Deixo uma sugestão: não se abandalhem, nem abandalhem a inteligência dos outros. Até ao fim, mantenham a calma. A Fernanda Câncio está em denial. Vê o mundozinho dela em que podia e pôde fazer e desfazer personalidades pública a ruir, com estrondo e lodo. Arriscou a reputação na cobertura de um governo sinistro e desespera com a desonra e ostracismo que se aproxima. Infelizmente já ninguém a pode salvar."

10.2.10

Nunca deites abaixo uma vedação sem saber a razão porque ela foi lá posta.

-G. K. Chesterton

3.2.10

Mário Crespo: "O primeiro-ministro a falar alto é intimidante"

por Patrícia Silva Alves, Publicado em 03 de Fevereiro de 2010

...Não, de modo nenhum. Eu não faço isto ad hominem. Estou a reagir ao que foi articulado por um detentor de um cargo. A única coisa que me interessa aqui é o José Sócrates primeiro-ministro, o que ele faz, o que motiva, o que ele desmotiva... o que ele planeia em respeito ao meu país.

Então é uma reacção..?

É uma perfeita reacção. Só estou a agir pró-activamente a uma situação que me parece muito anómala. E a maneira como fui referenciado é muito anómala. Eu até devo dizer que agradeço o que tenho despertado nos media, mas o centro da discussão não sou eu, nem o que eu fiz. O centro da discussão é aquilo que o José Sócrates disse. Essa é a única zona que me interessa. Agora a outra coisa que me começou a interessar foi o acto do "Jornal de Notícias"de censurar um cronista dos mais seniores que eles têm...

Diz que está a reagir pró-activamente. Vai dar mais algum passo em frente?

Farei uma queixa à ERC. Fá-la-ei nas próximas horas.

E em termos judiciais?

Nunca pensei em abordar a questão, movendo uma acção ao Sócrates por aquilo que ele disse. Não pensei fazer isso. Acho que dentro da área em que eu opero tenho mecanismos formais - a ERC, o sindicato, as organizações internacionais - que protegem jornalistas.

Vai fazer queixa junto dessas entidades?

Ai vou, vou.

Esta declaração de hoje, em que diz que as declarações de Sócrates visavam também Medina Carreira, foi feita perante jornalistas e com o símbolo do CDS atrás. Quer trazer os políticos e os partidos para esta discussão?

Não. Quero consciencializar e divulgar com consistência aquilo que aconteceu. E quero sensibilizar o país político também. Agora não cairia no ridículo de vir aqui e não falar sobre uma questão nacional, de interesse nacional. Portanto senti-me no dever, outra vez, de retratar claramente para os meus anfitriões, a minha versão.

Falou com Paulo Portas antes de discursar?

Não falei com ele. Mas sabia que ele respeitaria. Ele foi jornalista, está dentro da liturgia dos jornais, de como uma pessoa se sente dentro de um jornal.

É que estas declarações sendo feitas numa altura em que membros do governo se ameaçam demitir...

Quem é que está a ameaçar demitir-se?

Teixeira dos Santos. E Sócrates já teria também ameaçado demitir-se...

Então há esperança.

Como disse há pouco durante a sua intervenção a declaração de José Sócrates envolvia também Medina Carreira...

Em determinada fase envolvia os dois nomes.

Dois problemas que precisavam de ser solucionados?

Sim, presumo que sim.

E porque razão também Medina Carreira era um problema a solucionar?

Não faço ideia nenhuma. Agora é procurar obter uma resposta - se ele a der - a Sócrates, porque razão eu e o Medina Carreira somos problemas.

E não falou em mais ninguém?

Do relato que eu tenho não. E como disse tenho três relatos.

Havia uma terceira pessoa na mesa de Nuno Santos...?

Sim, havia uma terceira pessoa.

E também faz parte da televisão?

Não vou mais longe. No meio disto tudo a parte que eu acho importante é o primeiro-ministro. O Nuno Santos, a primeira vez que disse o nome dele foi hoje porque me disseram que se sabia...

Nuno Santos confirmou ao i que estava no restaurante com Bárbara Guimarães...

É extraordinário. Nunca pensei que ele dissesse o nome da Bárbara. Acho que são pessoas que não têm de ser trazidas ao conhecimento de todos. Eu nunca diria o nome da Bárbara por exemplo... Porque não é necessário.

Ficou triste com a reacção de Nuno Santos?

Fiquei. Acho que eu na mesma situação - eu meço sempre pelo que eu faria, por isso é que fiz uma pausa antes de responder. Eu na mesma situação teria reagido. Quero pensar que reagiria: "Olhe que eu conheço o homem, ele não é maluco nenhum. Não é impreparado nenhum. Isso agora também é subjectivo e certamente não necessita de solução rigorosamente nenhuma".

E confrontou Nuno Santos?

Logo, com o primeiro relato que tive. Logo, mal recebi o email, reencaminhei-o para o Nuno Santos e pedi-lhe uma explicação.

E a explicação que Nuno Santos lhe deu não foi suficiente para não o apontar na crónica?

Falei com ele para justificar o que aconteceu - e ele não justificou o que aconteceu. Consubstancia o que aconteceu.

Por isso é que também decidiu integrar o nome dele na crónica?

Era importante que ele tivesse reagido nas responsabilidades de que está investido [como director de programas da SIC]. É uma fragilidade, mas poderá ter sido de momento. O primeiro-ministro a falar alto é uma figura intimidante. Para quem é intimidável.

Acha que foi por acaso esta conversa ter sido no dia da apresentação do Orçamento do Estado?

O que eu achei extraordinário é que o dia do Orçamento do Estado é um dia importante. E eu gostaria de pensar que as pessoas que assumem as responsabilidade de gerir o país estão inteiramente focadas nisso. Não admito que no dia em que o orçamento está a ser retocado tenha tempo para pensar em banalidades. E a maneira como um articulista escreve, ou um analista como o Medina Carreira se comporta, é um assunto lateral. Não tem de estar na mente do primeiro-ministro.

E o que diz isso do primeiro-ministro?

Tem um conjunto de prioridades curiosas, inadequadas que para mim não estão correctas. Para mim como cidadão e como intérprete da nossa vida pública.

Há medo no jornalismo de hoje?

A resposta que a comunidade jornalística tem dado a este assunto é encorajadora de que não há inibição em retratá-lo e os editores consideram-no um episódio importante.

Mas, no dia-a-dia, quando o jornalismo se mistura com os interesses? Falou do caso de Manuela Moura Guedes...

Esse caso é, na minha opinião, o caso mais grave da história da imprensa desde o 25 de Abril. Não há dúvida nenhuma de que é uma situação séria. A maneira como transfiguraram a redacção da TVI é séria. Até digo mais, é séria a própria reacção da TVI... a maneira como foi desmembrado um programa que em termos comerciais era um sucesso. Era visto. Agora o que não é aceitável é que venham dizer que a pessoa está doida, precisa de ser internada num manicómio. É curioso... o Estaline fez isso! Portanto isto são mecanismos um bocado orgânicos e interpretações de poder um bocado questionáveis - e é isso que me preocupa essencialmente.

1.2.10

O Diário de Notícias é o único jornal que não menciona a censura sobre Mário Crespo. Uma vez mais, fica bem claro que nas mãos dos outros, tudo são instrumentos de opressão e autocracia; nas "nossas", é a vontade altruísta de servir o interesse colectivo. É a náusea.

Leitura recomendada

Discurso de Sir Winston Churchill, "The Sinews of Peace", agora que novos tiranetes e a extrema-esquerda, a reboque dos neo-grunhos socialistas, ameaçam outra vez o mundo civilizado.

O Fim da Linha

Mário Crespo

Terça-feira dia 26 de Janeiro. Dia de Orçamento. O Primeiro-ministro José Sócrates, o Ministro de Estado Pedro Silva Pereira, o Ministro de Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão e um executivo de televisão encontraram-se à hora do almoço no restaurante de um hotel em Lisboa. Fui o epicentro da parte mais colérica de uma conversa claramente ouvida nas mesas em redor. Sem fazerem recato, fui publicamente referenciado como sendo mentalmente débil (“um louco”) a necessitar de (“ir para o manicómio”). Fui descrito como “um profissional impreparado”. Que injustiça. Eu, que dei aulas na Independente. A defunta alma mater de tanto saber em Portugal. Definiram-me como “um problema” que teria que ter “solução”. Houve, no restaurante, quem ficasse incomodado com a conversa e me tivesse feito chegar um registo. É fidedigno. Confirmei-o. Uma das minhas fontes para o aval da legitimidade do episódio comentou (por escrito): “(…) o PM tem qualidades e defeitos, entre os quais se inclui uma certa dificuldade para conviver com o jornalismo livre (…)”. É banal um jornalista cair no desagrado do poder. Há um grau de adversariedade que é essencial para fazer funcionar o sistema de colheita, retrato e análise da informação que circula num Estado. Sem essa dialéctica só há monólogos. Sem esse confronto só há Yes-Men cabeceando em redor de líderes do momento dizendo yes-coisas, seja qual for o absurdo que sejam chamados a validar. Sem contraditório os líderes ficam sem saber quem são, no meio das realidades construídas pelos bajuladores pagos. Isto é mau para qualquer sociedade. Em sociedades saudáveis os contraditórios são tidos em conta. Executivos saudáveis procuram-nos e distanciam-se dos executores acríticos venerandos e obrigados. Nas comunidades insalubres e nas lideranças decadentes os contraditórios são considerados ofensas, ultrajes e produtos de demência. Os críticos passam a ser “um problema” que exige “solução”. Portugal, com José Sócrates, Pedro Silva Pereira, Jorge Lacão e com o executivo de TV que os ouviu sem contraditar, tornou-se numa sociedade insalubre. Em 2010 o Primeiro-ministro já não tem tantos “problemas” nos media como tinha em 2009. O “problema” Manuela Moura Guedes desapareceu. O problema José Eduardo Moniz foi “solucionado”. O Jornal de Sexta da TVI passou a ser um jornal à sexta-feira e deixou de ser “um problema”. Foi-se o “problema” que era o Director do Público. Agora, que o “problema” Marcelo Rebelo de Sousa começou a ser resolvido na RTP, o Primeiro Ministro de Portugal, o Ministro de Estado e o Ministro dos Assuntos Parlamentares que tem a tutela da comunicação social abordam com um experiente executivo de TV, em dia de Orçamento, mais “um problema que tem que ser solucionado”. Eu. Que pervertido sentido de Estado. Que perigosa palhaçada.

Nota: Artigo originalmente redigido para ser publicacado hoje (1/2/2010) na imprensa.