29.5.06

A folha em branco está, sabes, a tornar-se outra vez o eco das luzes na noite, uma espécie de farol com mesas abertas sobre pernas maduras. Não posso imolar contos à memória das nuvens mais impossíveis, não quero caber na prosa ilustre do cinismo instituído.
A partir de hoje és tu que traduzes a palavra cúmplice - dou-te a paisagem sem tréguas dos meus furores gratuitos. Faz com ela o resto da fome imprevista. Desejo-te nos elos que ligam aquilo que não escreves, procuro que nos possuamos como penhor da coincidência, caução do fantástico. Sabias que um amigo ousou um dia não haver ouro na mina? E que essa mesma partícula entre os mundos diurnos falou-me ontem de um sono que nos faria satélites? É verdade. Não posso a neve eterna nem quero contar lapsos a golpes de copo. O jarro preferível é sempre uma cópia, pálida e esdrúxula, do teu peito razão para a noite ventre e conforto.
Talvez te deseje nas curvas da estrada. Talvez desenhe penínsulas ocultas. Talvez a pele não termine onde supomos o ar.
Fica escrito no sol mais distante que a tua mão pariu estes minutos.

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