6.3.05

Domingo, em plena seca, no auge da aridez cáustica, apex destes seis meses em que a luz solar, em torrentes, não fez voltar costas ao toque gélido da apreensão, da deriva. Domingo, dia a enfiar na prateleira por excelência, Parque das Nações, Lisboa. Sem ter onde estacionar. Sem ter como fugir à licantropia que aflige os condutores, habituados apenas a produzir vida em monotarefa, que se deixam transportar para os roços do choque inesperado. Sem ter onde parar. Sem ar. A luz banha tudo inclemente. O ar é o mesmo, cubo a cubo, há duzentos dias. Luz. Limbo. Todos, sempre, no mesmo sítio nos mesmos dias às mesmas horas. Eu ali por acaso. Sem ter onde arrumar, em nome das eleições de há dez dias. De há quatro anos, há oito, há vinte. Sempre, ainda e sempre, uma república das bananas governada por sacanas. Hoje não houve pachorra. Lá se aguentou, para dentro, por dentro. Amanhã torno a reinventar a sobrevivência.

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